A preparação física e suas tendências

6/15/24

Desde que o futebol começou a se estruturar profissionalmente, em meados do século passado, surgiu a necessidade de se desenvolver abordagens mais científicas que dessem sustentação ao trabalho com atletas e equipes ao redor do mundo.

Nesta trajetória histórica do esporte, é inegável o papel ocupado pelo preparador físico em sua evolução, desenvolvendo o treinamento esportivo e suas metodologias e, assim, qualificando os treinamentos que repercutiram também na qualidade do jogo em várias de suas dimensões.

A preparação física vem evoluindo de forma grandiosa no futebol profissional e na formação de jovens futebolistas, com o suporte de áreas biológicas especializadas da ciência esportiva tais como a fisiologia, biomecânica, bioquímica, nutrição e incorporando às ciências humanas como a psicologia e o serviço social.

Com o passar do tempo e à luz dessa significativa evolução, outros aspectos, além do físico, foram se tornando igualmente relevantes ao conhecimento teórico e prático do profissional de preparação física, nomeadamente os aspectos metodológicos técnico-táticos-psicossociais, e mais recente, os emocionais.

Ao longo dos séculos, houve no futebol por parte de especialistas da área, uma fragmentação das partes física, técnica, tática e psicológica gerando a aquisição de conhecimentos isolados sob a perspectiva cartesiana onde o todo é isolado em partes e estudado separadamente. Diferentemente, hoje em dia, a busca por novos caminhos que substituam esse modelo de conhecimento tradicionalmente segmentado é notória, adotando-se abordagens mais integradas e sistêmicas que contemplem toda a complexidade do treinamento e do jogo, favorecendo uma preparação mais adequada às novas exigências do esporte.

O atual futebol demanda outros conhecimentos e habilidades, e acima de tudo, novas atitudes, sobretudo, a necessidade de expandir o conhecimento do movimento humano de forma intencional e do entendimento pleno do jogo onde todas as nuances técnico-táticas, mentais, emocionais, culturais e sociais são manifestadas.

Várias mudanças vêm ocorrendo no esporte, estruturalmente, as dimensões de diminuíram. Em paralelo, devido aos estudos e pesquisas aprofundadas na área da ciência esportiva, a condição atlética dos jogadores avançou em demasia, consequentemente o jogo de futebol alicerça-se em espaços reduzidos, com a necessidade de velocidade, seja na troca de passes, na condução de bola e/ou na tomada de decisão individual e coletiva.

Caracterizando essa exigência de maior velocidade nos atletas e na equipe, Wallace J.K et al. Evolution of World Cup soccer finals games 1966–2010: Game structure, speed and play pattern. J SciMed Sport. 2014; 17:223-228, após uma análise das finais da Copa do Mundo da FIFA entre 1966 e 2010, constataram um aumento no número de passes por minuto em cerca de 35% (de 11 para 15 passes/min) e um aumento na velocidade do jogo, usando rastreamento de bola, por 15% (de uma média de 8,0 m/s para 9,2 m/s).

Seguindo essa tendência equivalente no futuro, a velocidade do jogo será aumentada em ~5% entre 2010 e 2025 e em ~7% em 2030, atingindo um valor de cerca de 9,8 m/s. Nesse contexto, Nassi, P.G et al (Elite football of 2030 will not be the same as that of 2020:Preparing players, coaches, and support staff for the evolution), identificaram que o número de passes por minuto pode aumentar para mais 16 em 2030.

No que diz respeito à distância percorrida, os dados coletados da Premier League Inglesa entre 2006/2007 e 2012/2013 mostraram uma elevação de ~20% (aumento de ~3% ao ano) na distância percorrida em alta intensidade e um aumento de ~50% no número de ações de alta intensidade. A distância total em sprint aumentou 8% no mesmo período.

Projetando essa tendência semelhante à temporada 2013/2014, espera-se um aumento adicional de >40% na distância percorrida em corrida de alta intensidade em 2030 em comparação com a percorrida durante a temporada 2012/2013.

Em relação ao calendário de jogos, caracterizaram-se na temporada 2008/2009 um clube da elite europeia 50 jogos, ao passo que na temporada 2018/2019, esse número cresceu para 60 jogos. Somado a isso, para os melhores jogadores que são convocados para seleção de seu país, é preciso contabilizar os jogos amigáveis e os internacionais totalizando ainda mais partidas oficiais.

Diante deste cenário, concluímos que as atribuições e requisitos do profissional de preparação física devem ser regidos por periódicas sob a visão sistêmica do ser humano, onde o todo é complexo e indissociável das partes; (II) responsabilidade pelo desenvolvimento dos estímulos força-velocidade em contexto individual, coletivo e de jogo; (III) inclusão em conjunto com o treinador e o corpo técnico na construção da melhora da velocidade e assertividade da troca de passes, (IV) promover exercícios que estimulem o aprimoramento nas tomadas de decisões individuais e coletivas de forma específica ao futebol; (V) coletar, interpretar e disseminar os dados sobre a relação carga-esforço coletiva e individual dos atletas e assim monitorá-los, (VI) ter mecanismos recuperativos e profiláticos elaborados de estratégias individuais e coletivas de acordo com a necessidade e estrutura física; (VII) comunicação frequente e apropriada com outras áreas especializadas responsáveis pela saúde física e mental dos atletas; (VIII) estar atendo à novos dispositivos tecnológicos que possam potencializar tarefas e entregar resultados mais completos; (IX) compreender a complexidade do futebol por meio dos jogadores e do staff que o cercam no trabalho diário.

Por fim, se faz necessário deixar para o passado às abordagens tradicionais (mecanicistas e cartesianas), e então intensificar as intervenções práticas em processos que integram a complexidade da área esportiva e humana que exige, em especial, muita dedicação, maturidade, inteligência, estudos e pesquisas. E mais, tudo isso devidamente alinhado ao seu próprio propósito de vida!